Em agosto de 2015, houve o lançamento do Programa de Investimento em Energia Elétrica (PIEE), apresentando-se um documento que reuniu os projetos previstos para serem contratados entre 2015 e 2018. Do total informado, a fonte biomassa poderá chegar a representar 16%, sendo capaz de no seu limite superior de contratação (5 mil MW) superar todas as fontes em volume de contratação, perdendo apenas para as grandes hidrelétricas.
Adicionalmente, em dezembro último, o Governo Federal levou metas para a Conferência das Partes (COP-21), dentre elas a de aumentarmos o uso sustentável de energias renováveis (solar, eólica e biomassa), excluindo energia hidrelétrica, para ao menos 23% da geração de eletricidade do Brasil até 2030.
Nos dois eventos supracitados, a bioeletricidade ganhou realce como contributo importante para o cumprimento desses compromissos apresentados, sendo louvável o resgate dessa fonte nos discursos oficiais de forma regular.
Todavia, observa-se que 2015 foi um ano em que o hiato entre a intenção e a realidade setorial alargou-se. O ano de 2015 foi o terceiro menor volume de contratação em leilões de energia nova no ambiente regulado desde que o modelo de contratação foi implementado pela Lei 10.848/2004, comprometendo o acréscimo de MW novo advindo da bioeletricidade em anos futuros na matriz elétrica brasileira.
Em 2015, foram comercializados apenas três projetos de bioeletricidade sucroenergética (52 MW médios) nos leilões de energia nova, um volume superior apenas ao único projeto comercializado em 2009 (10 MW médios) e ao ano de 2012 quando batemos o recorde negativo, ou seja, nenhum projeto energia nova comercializado no Ambiente de Contratação Regulada (ACR) negociado naquele ano.
O próximo leilão regulado de energia nova em que a biomassa poderá participar já está agendado para 31 de março de 2016. Será o Leilão A-5/2016, que contratará energia de novos projetos para entrega a partir de 2021. Assim, o A-5 de 2016 será uma importante oportunidade [ou até a única, se descontarmos o A-3] para a fonte biomassa ter um desempenho em contratação de projetos novos no ACR distante do apresentado nos anos de 2015, 2012 e 2009 de recordes negativos.
Nos últimos anos, observamos um esforço significativo por parte do Governo Federal em promover a diversificação da matriz elétrica brasileira, com diretrizes centradas em estimular as fontes eólica e solar, a mini e micro geração distribuída e a fonte gás natural. Contudo, em relação à biomassa, ainda estamos distantes do adequado para estimular um investimento mais vigoroso nesta importante fonte renovável para o país. Mas há oportunidade para diretrizes especificas para a bioeletricidade encorajarem a melhora no ambiente institucional vigente, dentre elas:
• Desde 2011, a biomassa não tem sido convidada a participar dos leilões de energia de reserva – inicialmente desenhados justamente para esta fonte, fechando-se uma porta importante para a bioeletricidade. Porque não retornarmos a contratar a bioeletricidade nos leilões de reserva a partir de 2016? A geração da bioeletricidade é muito mais previsível e regular ao longo do ano, durante a safra sucroenergética e o período seco do sistema.
• A partir de 2013, nos leilões A-5, separou-se a biomassa da concorrência direta com as eólicas, mas a biomassa passou a concorrer diretamente com o carvão, sem nenhuma distinção quanto à sustentabilidade ambiental das fontes. Porque não termos leilões ou produtos dentro de um leilão para a biomassa, como estamos tendo para outras fontes, mas com preços realmente adequados à biomassa e que precifiquem adequadamente os benefícios desta fonte para o sistema?
• A conexão das térmicas a biomassa ocorre principalmente no âmbito da distribuição, no que podemos chamar de “puxadinho”, representando uma barreira relevante para as mais de 170 usinas sucroenergéticas que ainda não exportam excedentes de energia para a rede. Porque não há nenhum programa estruturado de longo prazo que efetivamente mitigue a dificuldade de conexão desses projetos à rede de distribuição?
• Cabe notar que ocorreu um avanço na regulamentação da revisão da garantia física para usinas a biomassa, mas ainda está distante de a metodologia enxergar o comportamento de uma geração intrinsicamente atrelada a uma cultura agrícola. Porque não fazer uma regulamentação que reconheça as particularidades da biomassa na questão da revisão ordinária da garantia física dessas usinas, dando segurança ao investidor e ao financiador dos projetos?
• Em 2015, foi alterada a Lei 10.848/2004 para permitir um Valor Anual de Referência Específico (VRES) por fonte que estimule a contratação da geração distribuída, sendo definidos os valores para as fontes solar fotovoltaica e cogeração a gás natural. Embora, afirma-se que para as demais fontes o VRES será divulgado em 2016, não há nenhuma discussão consubstanciada entre Governo Federal e representantes do setor da biomassa sobre o tema. Se há distribuidoras que reconhecem a importância da contratação de geração distribuída com foco em biomassa, pelos benefícios técnicos que esta fonte apresenta, porque não estimular rapidamente uma regulamentação que dinamize este modelo de contratação?
Os aspectos mencionados acima são algumas das várias questões regulatórias que representam, na verdade, oportunidade para transformar as dificuldades da expansão da bioeletricidade em estímulo ao seu desenvolvimento – tudo depende do ponto de vista.
Em termos de evolução anual de capacidade instalada, a fonte biomassa teve seu recorde no ano de 2010, com 1.750 MW (equivalente a 12,5% de uma Usina Itaipu), resultado de decisões de investimentos antes de 2008, quando o cenário era estimulante à expansão do setor sucroenergético. São bons anos como 2010 que têm permitido a bioeletricidade, ainda hoje, bater sucessivos recordes de geração, justamente em momentos críticos para o Sistema Interligado.
Porém, de acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), a fonte biomassa, que já chegou a representar 32% do crescimento da capacidade instalada no país, tem previsão de participar em 2016 com apenas 6% da expansão anual da capacidade instalada no Brasil, índice que poderá cair para apenas 1% em 2020.
Há tempo para tentar reverter esse cenário e tornar a expansão da bioeletricidade na matriz elétrica mais aderente às intenções que têm sido anunciadas. Para tanto, será fundamental a definição de ações e políticas públicas de longo prazo que possam efetivamente materializar essas metas. Algumas dessas ações foram discutidas neste artigo!
Zilmar José de Souza é gerente de bioeletricidade da Unica – União da Indústria de Cana-de-Açúcar
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